A BALAIADA
A BALAIADA: O estopim dos acontecimentos da Balaiada foi o fortalecimento da Província do Rio de Janeiro com a chegada de D. João ao Brasil e da família Real, em detrimento das demais províncias, notadamente a de Pernambuco, Grão Para e Maranhão. Coincidiu com o declínio do preço mundial do açúcar. O Vice Reino passou a negar sistematicamente créditos para as demais províncias fazendo o Maranhão sofreu com a impossibilidade de manter sua produção da cana de açúcar. Restava a produção do algodão que estava em alta de preço, tendo como principal comprador a Inglaterra. Porém, a Corte Lusitana no Rio impedia que os produtores maranhenses negociassem diretamente com o Reino Unido. Some-se a isso que os produtores e comerciantes portugueses e seus descendentes diretos, sediados na província do Maranhão e Grão-Pará, tinham privilégios assoberbados com relação aos dos brasileiros natos. Por exemplo: os prefeitos e edis dos municípios provincianos eram escolhidos por indicação dos portugueses. Os brasileiros não participavam dessas escolhas. Os filhos dos portugueses gozavam de vantagens não estendidas a filhos de brasileiros como estudar em Coimbra, Portugal, recebendo bolsas da Corte. Inicialmente, a filosofia da Balaiada era conquistar a ferro e fogo o mesmo direito e privilégio reconhecidos aos portugueses e seus descendentes diretos. Manoel Gonçalves Dias, pai de Antonio Gonçalves Dias, contemporâneo da balaiada, por exemplo, era um comerciante português privilegiado pela política Real. Tanto ele como os demais portugueses detinham facilidades na Corte além mar. Dois partidos políticos regionalizados tratavam dos interesses das partes: O Partido dos Cabanos (nada a haver com a CABANADA no Pará) representava os interesses dos portugueses e eram simpáticos à Coroa Portuguesa, enquanto que o Partido dos Bentivis era composto por brasileiros e se dizia liberal. Eclodiu a revolta de caráter elitista na segunda Regência de D. Pedro II, em oposição ao Marques de Olinda, o Pernambucano Pedro de Araújo Lima. A Revolta Balaiada encabeçada pelas elites latifundiárias e algum segmento da Igreja alinhados ao grupo dos Ben-ti-vis tinha como causa e bandeira de luta seus próprios interesses. Não estava previsto a abolição do escravismo negro e melhorias das condições de vida dos maranhenses pobres. Imprevisivelmente três líderes populares, um negro cearense (COSME BENTO DAS CHAGAS – o temido NEGRO COSME), um vaqueiro piauiense (RAIMUNDO GOMES VIEIRA JUTAÍ, o CARA PRETA), e um artesão maranhense (MANOEL FRANCISCO DOS ANJOS FERREIRA, o MANOEL BALAIO), tomaram o controle do movimento, e sob esse triplo comando a luta foi redirecionada incluindo na proposta de luta a abolição do escravismo negro e melhoria de vida da população ribeirinha do Itapecuru. As elites ditas liberais inconformadas com a reviravolta abandonaram o propósito inicial e passaram a financiar a Regência no sentido de enviar tropas militares do Rio e combater os revoltosos. Foi quando o tenente coronel de exercito, o carioca LUIS ALVES DE LIMA E SILVA, recebeu do Regente Pedro de Araújo Lima a nomeação de Governador do Maranhão e comandante em chefe das tropas maranhenses, findando com a chacina dos insurgentes. Aspectos do movimento: a) SOCIAIS - declínio das riquezas do Maranhão e Piauí com o empobrecimento das elites e miséria da população esquecida pela Corte do Rio. b) ECONOMICOS - baixa internacional nos preços do açúcar e carne bovina, e imposição da Corte do Rio proibindo o Maranhão em comercializar seu algodão diretamente com a Europa. c) POLITICOS - confronto ideológico entre brasileiros e portugueses, encabeçados pelos partidos dos Cabanos (portugueses) e dos Bentivis (brasileiros). d) CULTURAIS - A cultura dominante era elitista e ditada diretamente de Lisboa e Coimbra. As manifestações culturais negras e indígenas não eram difundidas. Isto é, não saiam dos Quilombolas e das aldeias. e) O movimento não contou com a participação indígena. VENILDOJBR@HOTMAIL.COM
INTRODUÇÃO
Em meados do ano de 1838, um movimento armado pontual e localizado se estabeleceu no Maranhão. Esse movimento tinha característica político-partidária encabeçado pelo Partido dos Bentivis (Bem-ti-vis=avanço liberal) contra os interesses dos que compunham o Partido dos Cabanos (Cabano=regresso conservador). É fácil entender: Os Cabanos representavam os interesses dos portugueses e eram simpáticos à Coroa Portuguesa. Enquanto os Bentivis eram compostos por brasileiros e se diziam liberais. Naquela época ser liberal era posicionar-se contra a forma de governo monárquico, defender os brasileiros natos livres e ser radicalmente contra os portugueses natos e seus descendentes diretos, porém não eram abolicionistas. Ainda no mesmo ano, o movimento elitista tomou o aspecto de movimento popular. Isto é, o foco objetivado mudou completamente por razões alheia a vontade dos Bentivis, e continuou como movimento popular apartidário armado contra os interesses das elites de então (tanto Cabanos, quanto Bentivis). O cenário dos acontecimentos mais importantes centralizou-se na cidade de Caxias (antes chamada de Vila de Caxias das Aldeias Altas), cujo levante resistiu até 15 de janeiro de 1841, tendo sido violentamente desmantelado pelo aplaudido e vitorioso carioca, o então Coronel de Brigada Luis Alves de Lima e Silva, nomeado pelo menino D. Pedro II governador do Maranhão e comandante geral das forças oficiais imperiais na campanha militar contra os Balaios.
ANTECEDENTES HISTORICOS DA BALAIADA
A província do Grão Pará e Maranhão, onde hoje se localiza toda Região Norte e os estados de Mato Grosso, Maranhão e Piauí, não aceitou a emancipação do Brasil proclamada por Dom Pedro I (Pedro de Alcântara Francisco Antônio João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbom), em 7 de setembro de 1822, cujo brado ocorreu em São Paulo, no riacho do Ipiranga (onde hoje está o Museu do Ipiranga), opondo forte resistência às tropas independentistas.
Apesar de D. João VI (João Maria José Francisco Xavier de Paula Luis Antonio Domingos Rafael), Rei de Portugal, se posicionar favorável à independência proclamada por seu segundo filho varão, D. Pedro I, inclusive incentivando-o nesse sentido, desejava que a província do Grão Pará e Maranhão continuasse Vice-Reino de Portugal (Colônia), respondendo diretamente à Coroa Lusitana, dada a sua situação geográfica favorável à Europa e ao grande rebanho bovino e lavoura de algodão nas mãos de criadores portugueses do Piauí, Maranhão e Pará.
O Major lusitano João José da Cunha Fidié, fiel comandante das tropas portuguesas sediadas na capital do Piauí (Oeiras), em 13 de novembro de 1822, partiu da capital e marchou em direção a Vila de São João do Parnaíba (hoje Parnaíba) onde se ensaiava um movimento pró-independência. Chegou no dia 18 de dezembro de 1822, não encontrou resistência e obrigou o Senado (Câmara Municipal) local a renovar os votos de fidelidade a D. João VI (leia-se: Reino de Portugal).
Em 1º de março de 1923, Fidié e seu estado maior tomando conhecimento de que a tropa do Major paraibano Leonardo de Carvalho Castelo Branco (Leonardo de Nossa Senhora das Dores Castelo Branco), comandando militares cearenses e lavradores piauienses, havia conquistado a capital Oeiras e Campo Maior, proclamando sua independência, como também foi avisado de que havia forte resistência à coroa lusitana na região do cocais, (Fidié) deixa Parnaíba com destino a Oeiras, a fim de retomar a capital. Eis que, antes de seu destino final, encontra as tropas de Leonardo de Carvalho Castelo Branco, entrincheiradas ao longo do riacho Jenipapo, localizado então entre a atual Teresina e Campo Maior.
Leonardo de Carvalho Castelo Branco e outros comandantes, ao perceberem a iminente derrota deixaram os combatentes à própria sorte, sendo depois criticados pela opinião pública da época. No dia 13 de março de 1823, Fidié venceu facilmente os facciosos despreparados para o enfrentamento militar, fazendo mortos, feridos e prisioneiros (prisioneiros e feridos foram posteriormente libertados). Ao revés e na contramão da história, o Estado do Piauí, postumamente, em 21 de outubro de 2005, elevou Leonardo de Carvalho Castelo Branco à condição de herói pelo enfrentamento a Fidié, com data em destaque na Bandeira desse Estado, fazendo-o patrono do 25º Batalhão de Atiradores e Caçadores do Exército em Teresina-PI, chamado de Batalhão Leonardo de Carvalho Castelo Branco.
Em seguida, Fidié caminhou à Vila de Caxias das Aldeias Altas, no Maranhão (depois cidade de Caxias), sendo recebido triunfalmente no dia 17 de abril de 1823 pelo Senado da localidade. Montou refúgio no Monte das Tabocas (não confundir com o Monte das Tabocas em Pernambuco), hoje Morro do Alecrim, onde depositou todo o arsenal bélico da coroa portuguesa e aquartelou a tropa. Ficou aguardando auxilio da capital maranhense e da Coroa Portuguesa, a fim de reorganizar-se no sentido de refazer sua força militar e retomar Oeiras. O apoio militar nunca chegou, pois o escocês Lord Thomas Alexander Cochrane, e seus corsários, mercenários ingleses, contratado pelos independentistas brasileiros, faziam o bloqueio naval na costa maranhense, inclusive já tinha vencido a esquadra portuguesa em 4 de maio de 1823, no Atlântico, e continuava patrulhando a costa brasileira contra agressão estrangeira.
Em 1º de agosto de 1823, Fidié não resistiu ao cerco da Vila de Caxias por tropas brasileiras e capitulou. Foi perdoado por D. Pedro I e condecorado em Lisboa com a mais alta e distinta honra militar da Corte Lusa.
Daí em diante a Vila de Caxias passou a ter uma importância estratégica militar, já que havia um arsenal bélico instalado no Monte por Fidié e pelas tropas brasileiras vencedoras.
Em 5 de julho de 1836, Caxias foi elevada a condição de cidade e passou a ser considerada informalmente de Capital do Leste do Maranhão.
Porém, o Maranhão foi severamente punido pela ousada resistência e posição contrária a independência, deixando de ser prioritário no contexto do império recém instalado (e, mais tarde, no da República), sofrendo embargo econômico e isolamento político, reflexo que vivenciamos nos dias atuais.
AS OLIGARQUIAS DO MARANHÃO
A Guerra dos Bentivis, que deu origem a revolta dos balaios, foi inicialmente orquestrada por um seguimento da igreja católica, pela liderança aristocrática urbana e pela oligarquia rural da região (há distinção entre aristocracia e oligarquia), poligonada principalmente pelas Vilas de Itapecuru Mirim, Coroatá, Pastos Bons e Caxias, todas no Maranhão, inconformadas com a política tributária emanada da capital da província (São Luis) e do governo central (Rio de Janeiro) com o fim do primeiro império (abdicação de D. Pedro I), e da ascensão das Regências (políticos no poder a espera da maioridade do Príncipe Regente D. Pedro II). Na realidade os brasileiros do maranhão, principalmente a oligarquia rural, não aceitava a idéia de ser governada por políticos. Aceitava ser governados por monarca ou militar. Era a tradição européia, motivo de tantas quarteladas, golpes e derrubadas nas nações que sofreram colonização européia (principalmente nas das Américas, África e Ásia - o Brasil sofreu diversas, a mais longa foi a de 31 de março de 1964 a 8 de maio de 1985). Também, Não tolerava a Segunda Regência Una do político Marques de Olinda, o pernambucano Pedro de Araújo Lima, que privilegiava os interesses da Coroa Britânica sobrepondo-se aos dos portugueses (os políticos no poder não se entendiam, todos queriam ser regente de D. Pedro II – foram quatro regências no período de 1831 a 1840). Explica-se: com a guerra da independência dos Estados Unidos da América (1775 a 1783), a Inglaterra passou a ser o maior comprador de algodão do Brasil, principalmente do produzido no Maranhão.
AS REVOLTAS REGENCIAIS
Aquele foi um período em que o Império do Brasil "pegava fogo". Eclodiam revoltas de norte a sul. A Cabanagem (1835 — 1840) em Belém do Pará, a Revolta dos Escravos Malês=Negros Muçulmanos (1835) e a Sabinada (1837 — 1838) em Salvador da Bahia, e a Guerra dos Farrapos (1835 — 1845) no Rio Grande do Sul e Santa Catarina.Esta última (movimento Farroupilha) foi a mais longa guerra civil que se tem conhecimento na história do continente americano (maior que a Guerra da Independência e a da Secessão dos EUA), envolvendo aparato bélico de grande poder ofensivo, com armada e tropa estrangeira mercenária comandada pelo pirata italiano Giuseppe Garibaldi.
A GUERRA DOS BEM-TI-VIS
A Guerra dos Ben-ti-vis percussora da Balaiada aconteceu no Período Regencial Uno de Pedro Araújo Lima, chamado de 4ª Regência, dado ao descontentamento das elites maranhenses com o Império do Rio de Janeiro.
Além disso, havia conflitos partidários no Maranhão envolvendo disputa de interesses políticos entre Cabanos e Bentivis (Bem-ti-vis). Os Bentivis defendiam radicalmente as idéias do liberalismo e do iluminismo. Exaltando-se para o confisco dos bens e expulsão dos portugueses. Por seu turno, os Cabanos defendiam os interesses dos portugueses e desejavam o retorno do Brasil às hostes do Reino Português. Dessa forma, o epicentro da Guerra dos Bentivis não foi a já cidade de Caxias. O centro nervoso foi pontuado em diversas localidades do Grão Pará, Maranhão e Piauí.
No caminhar das lutas encabeçadas pelos Barões do gado, do Couro, do óleo e do algodão, três fatos isolados mudariam o rumo do movimento.
Para efeito didático, centralizamos os fatos no entorno de Caxias (Vila Manguá - hoje Nina Rodrigues, Calabouço, Mearim e outras localidades históricas).
Primeiro fato: em 13 de dezembro de 1838, o vaqueiro piauiense Raimundo Gomes Vieira Jutaí, o Cara Preta, assumidamente Bentivi, inconformado com a prisão de um irmão, auxiliado por outros vaqueiros invade a cadeia pública de Nina Rodrigues, liberta o irmão, solta todos os presos, alicia os soldados do destacamento local, apropria-se do armamento e munição, e forma um bando de Cangaceiros a espalhar o terror e saques por toda a região, cuja força marginal passou a perseguir os interesses dos partidários Cabanos, sem dó ou piedade. Com esse feito a revolta passou a chamar-se de Guerra dos Bentivis com seu epicentro em Caxias.
Segundo fato: a 2 de janeiro de 1839, Raimundo Gomes Vieira Jutaí, o Cara Preta, recebe a adesão do negro forro, cearense da Vila de Sobral, Cosme Bento das Chagas, o temido Negro Cosme, homem letrado, carismático, beligerante e nada sutil, líder de negros fugitivos. Decerto o mais importante líder da balaiada, reforçando o Bando e a causa dos Bentivis.
Terceiro fato: O Capitão Antonio Raimundo Guimarães, da tropa dos Cabanos, enviado de São Luis para combater os Bentivis de Caxias, entra na casa do artesão de cestas Manoel Francisco dos Anjos Ferreira, o Manoel Balaio ou Artesão da Palha, e estupra suas duas filhas moças, menores de idade. A desonra causa revolta entre os habitantes mestiços livres, fazendo com que o Manoel Francisco dos Anjos Ferreira, o Manoel Balaio, arrebanhasse em torno de si a população pobre da região, integrando-a ao grupo armado de Raimundo Gomes Vieira Jutaí, o Cara Preta, e de Cosme Bento das Chagas, o Negro Cosme. Daí em diante o movimento denominou-se de Balaiada, em razão de Manoel Francisco dos Anjos Ferreira, o Manoel Balaio, e alguns de seus liderados exercerem atividade artesã de confecção de balaios, isto é, cestas fabricadas com fibras de Palmeiras (principalmente Babaçu, Buriti e Carnaúba) abundante na região dos cocais maranhense e piauiense.
A REVOLTA DOS BALAIOS
Apesar de historiadores defenderem a participação de cearenses e piauienses no entrave do Maranhão, pelo lado dos balaios, não há registro contundente dessa participação, apenas o ensaio remoto do filho de Leonardo de Carvalho Castelo Branco (vencido por Fidié), o piauiense morador de Campo Maior, no Piauí, jornalista Lívio Lopes Castelo Branco e Silva, que abandonou a Balaiada nos primeiros confrontos.
O filho ilustre da cidade de Caxias, contemporâneo da Balaiada, o poeta Antonio Gonçalves Dias, então acadêmico de Direito da Universidade de Coimbra, em Portugal, nunca se pronunciou acerca da revolta dos Balaios, mesmo que modestamente, apesar dos apelos de sua madrasta (certa dama portuguesa), residente em Caxias. Explica-se: Antônio Gonçalves Dias temia os Bentivis, haja visto que seu pai Manoel Gonçalves Dias (português) tinha sofrido perseguições daquele partido nativista.
Não há registro da participação de índios entre os revoltosos, apenas de mestiços e negros. Explica-se: A ordem religiosa da Igreja Católica dominante na região, não aceitava escravidão pré-colombiana (silvícolas nativos), porém tolerava a escravidão negra (africanos e afro-decendentes).
As demais cidades abandonaram a causa. A cidade de Caxias passou a ser o ponto crítico de resistência popular. A economia sertaneja da província na região dos cocais entrou em declínio.
Houve o recuo da igreja e dos fazendeiros oligárquicos e usineiros aristocráticos ao perceberam seus interesses escravista em risco. Os Balaios monopolizaram o conflito contra a província e, consequentemente contra o Império instalado no Rio de Janeiro e Petrópolis. Atitude que mais adiante os levariam ao completo isolamento. As três lideranças (vaqueira, negra e artesã) trataram de conquistar a cidade de Caxias onde estava o arsenal deixado por Fidié e os armazéns gerais de produtos de exportação, além do cofre do erário público. O Presidente (Prefeito) de Caxias, João Paulo Dias Carneiro, investiu-se na função de autoridade policial, formou uma milícia popular e a colocou sob comando do Capitão e professor Ricardo Leão Sabino. A cidade resistiu por 46 dias ao cerco dos Balaios, fazendo ferido o líder Balaio Manoel Francisco dos Anjos Ferreira, o Manoel Balaio. A cidade de Caxias, finalmente, capitula no dia 1º de julho de 1939. O Prefeito João Paulo Dias Carneiro e o Capitão Ricardo Leão Sabino fogem aterrorizados.
Manoel Francisco dos Anjos Ferreira, o Manoel Balaio, em conseqüência do ferimento que sofreu da artilharia do Major Ricardo Leão Sabino, morreu acometido de infecção generalizada pela gangrena em 9 de outubro de 1839.
Daí em diante não se fala mais de Cabanos e Bentivis. Somente em Balaios.
AS REIVINDICAÇÕES DA ELITE E DA POBREZA
As oligarquias e a igreja queriam a coroação imediata da criança D. Pedro II (Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano Francisco Xavier de Paula Miguel Gabriel Rafael Gonzaga de Bragança e Habsburgo), Príncipe Regente, na medida em que acreditava que com a instalação do Segundo Império (tecnicamente só houve um Império), viria naturalmente o enfraquecimento da influência dos políticos nos rumos da nação, a valorização dos seus produtos de exportação e tributação mais justa. Além de uma maior aproximação com a Corte de Lisboa, distanciando-se do Império Britânico essencialmente abolicionista. Por outro lado os Balaios desejavam ver seus subordinados libertos e seus balaios valorizados, já que eram os recipientes produzidos artesanalmente que acondicionavam os grãos e outros produtos de exportação. Além disso, os trabalhadores viviam em estado social de verdadeiro flagelo e desejavam uma maior participação social do estado. Instalou-se o conflito local de interesses com a proposta rebelde.
A DECADENCIA DO MOVIMENTO BALAIO
Os oligárquicos e a igreja contavam com a força da Guarda Nacional, - milícia criada de ultima hora por decreto do então Ministro da Justiça Padre Diego Antônio Feijó, no dia 18 de agosto de 1831, com a finalidade de distribuir patentes de militar a fazendeiros ricos (principalmente as de Capitão, Major e Coronel) -, e das tropas da Coroa do Império. Note-se que naqueles idos os ricos, dependendo da fortuna que possuíam, compravam patentes militares, notadamente à de Capitão e Coronel.
Os revoltosos detinham o paiol de armas e munições da cidade de Caxias e um contingente aproximado de três mil homens plantados no Monte das Tabocas, despreparados para o combate militar. Matutos sem disciplina nem instruções de guerrilha, sem nenhuma disposição a morrer pela causa abolicionista. Entrementes, já sofriam há três anos com a desorganização econômica da cidade de Caxias. Além disso, havia conflito intestino de comando. O líder balaio Manoel Francisco dos Anjos Ferreira, o Manoel Balaio, estava morto. Ninguém se entendia. As armas que possuíam eram de baixo poder ofensivo. A pólvora estava escassa e o contingente de revoltosos, a essa altura, estavam desistindo deliberadamente do pleito, pois não viam uma linha ideológica de atuação pragmática com metas determinadas. Se não bastasse, o Imperador Dom Pedro II (Coroado ilegalmente em 23 de julho de 1840) editou um decreto em 22 de agosto de 1940, anistiando aqueles que depusessem as armas. Aproveitando o ensejo, o líder vaqueiro Raimundo Gomes Vieira Jutaí, o Cara Preta, orientado pelo amigo Padre Inácio Mendes de Moraes e Silva, aderiu à anistia, alcançando-a sob condição de desterro em São Paulo. Morreu a bordo do navio antes de chegar a seu destino. Outras centenas de insurgentes aceitaram a anistia.
A liderança do movimento passou unicamente para Cosme Bento das Chagas, o Negro Cosme.
Atente para o fato de que as facções dos vaqueiros e dos artesães estavam aflitas com a perda de seus líderes, e não comungavam com os métodos violentos utilizados por Cosme Bento das Chagas, o Negro Cosme, contra seus vencidos (pilhagem, tortura e humilhação).
Isolados, sem o apoio da igreja e sem a influência dos produtores, comerciantes e exportadores, restava aos remanescentes Balaios apenas à espera de um confronto final ou rendição condicionada à valorização da mão-de-obra e da libertação definitiva dos escravos envolvidos. Várias propostas de acordo nesse sentido foram encaminhadas pelos facciosos, porém todas rejeitadas pelos representantes do Império.
O REVIDE IMPERIAL
Veio o revide.
As forças governamentais da província do Maranhão e a milícia da Guarda Nacional, temerosas com o fato de Cosme Bento das Chagas, o Negro Cosme, autodenominar-se de Dom Cosme, Tutor, Imperador e Defensor da Liberdade, interpretaram como de extrema ousadia. Mobilizaram-se no sentido de trazer tropas de todo o Norte e Meio-Norte leais ao Império para conter o movimento negro. Antes, porém, o Presidente (Governador) da província do Maranhão, o Capitão Manoel Felizardo de Sousa e Melo, tomou o cuidado de pedir apoio ao Governo Central no sentido de reforçar as tropas locais. O Império acata o pedido, porém exonera Felizardo por considerá-lo fraco, e destaca o Coronel Luis Alves de Lima e Silva, promovendo-o a General de Brigada, conotando-o de Comandante-Geral das Tropas Oficias e Governador-Geral do Maranhão. Fala-se que Luis Alves de Lima e Silva nutria um desprezo gratuito pelo Dom Cosme, adjetivando-o de "verme infame, feiticeiro, facínora, maldito, selvagem, bode" e outros impropérios e qualificativos do gênero.
O IMPERIO CONTRA ATACA
Em 15 de janeiro de 1841, o Governador e Comandante Militar Luis Alves de Lima e Silva com seu intendente, General Francisco Sérgio de Oliveira, entra triunfalmente em Caxias com um contingente preparado para o combate, com canhões de alto poder destrutivo e outras peças de artilharia pesada. Intimidados, os Balaios não opõem reação. Intermediados pela Igreja os revoltosos se rendem. Os aprisionados foram perdoados, porém os escravos não foram libertos e voltaram à tutela de seus "proprietários" (tanto proprietários Bentivis, quanto proprietários Cabanos). O líder Cosme Bento das Chagas, o Dom Cosme, não aceita a rendição e empreende fuga na esperança de reorganizar quilombolas e continuar a luta. Porém, é capturado junto com seus seguidores negros e, em 20 de setembro de 1842, é enforcado em praça pública, na cidade de Itapecuru Mirim. Frise-se: o enforcamento de Dom Cosme se deu em razão de uma condenação anterior, sentenciado a morte pelo homicídio de seu antigo Patrão em 1830. Inclusive, por esse fato chegou a cumprir pena de reclusão em São Luis, por quatro anos (1830 a 1833), esperando o trânsito em julgado da decisão, conseguindo escapar antes e refugiar-se na região dos cocais.
O Monte das Tabocas (nada a haver com a expulsão dos holandeses em Pernambuco) foi rebatizado como Morro do Alecrim, onde o General vitorioso edificou um quartel militar e instalou a Brigada vencedora e seu Estado Maior. Esse contingente incumbiu-se no objetivo de garantir a segurança no eixo das cidades de Caxias e Pastos Bons.
A vitória da Guerra dos Balaios pelo Presidente da Província Luis Alves de Lima e Silva foi simplória, uma vez que dirigida unicamente aos negros de Dom Cosme Bento das Chagas. Por esse feito, recebeu em 18 de julho de 1841 o título nobiliárquico de Duque de Caxias. Mais tarde recebeu o título de Pacificador, por negociar o fim das revoltas em curso no período Regencial. E, postumamente, durante o governo do presidente João Belchior Marques Goulart, no dia 13 de março de 1962, foi reconhecido como Patrono do Exército Brasileiro. Sua data de nascimento, 25 de agosto, empresta as comemorações ao dia nacional do soldado de infantaria do Exército.
Como já foi frisado, após pacificar o Maranhão em 1941, o Brigadeiro Duque de Caxias, em 1842 sufoca o levante liberal de São Paulo e Minas Gerais. No dia 1º de março de 1845 dá fim a Guerra dos Farrapos, vencendo Bento Gonçalves da Silva e seu mercenário Giuseppe Garibaldi. Em 5 de setembro de 1851 adentra em Montevidéo e vence o uruguaiu Manuel Ceferino Oribe e Viana, e, em seguida, marcha sobre Buenos Aires vencendo o argentino Juan Manuel de Rosas. Em dezembro de 1864 é aclamado vitorioso ao lado de argentinos e uruguaios, na Guerra contra Francisco Solano Lopes, do Paraguai (Guerra do Paraguai). O Duque de Caxias foi o responsável pela tranquilidade e ausência de animosidade interna no trancorrer do mandato (Imperio) de D. Pedro II.
A GUERRA DE CANUDOS E A BALAIADA
Certa ocasião, confabulando com jovens acadêmicos do curso de Bacharelado em História, no Campus da Universidade Estadual do Maranhão, em Caxias, fui indagado se a Balaiada guardava alguma semelhança com outros movimentos populares armados? Em resposta, afirmei que grande semelhança havia desde que situado no contexto do momento histórico. Veio à cabeça A Guerra de Canudos (1896, 1897 - do beato Antonio Conselheiro). Nos dois casos (Balaiada/Canudos), os vencedores esqueceram a civilidade e elegerem a barbárie, atrocidando os vencidos. Os dois movimentos se equiparam na medida em que combateram o latifúndio improdutivo, a imprensa e o clero, enfrentando tropas estatais. Os demais movimentos brasileiros, ou foram elitistas ou em busca da "causa" de algum segmento social sem a genuína participação popular.
A REALIDADE ATUAL
As elites pouco a pouco se desfizeram da idéia de que a monarquia era a melhor forma de governo para os brasileiros. Impuseram à República Federativa de três poderes e o sistema presidencialista. Se alhures as elites não acreditavam nos políticos, hoje esse sentimento é fortemente notado nas camadas pobres ainda esquecidas.
O MORRO DO ALECRIM
Com o passar do tempo, o Morro do Alecrim foi consagrado como local onde a memória do movimento da Balaiada é mais bem representada. Pensar Balaiada no tocante a Caxias é vislumbrar o Morro do Alecrim.
Atualmente todas as homenagens recaem merecidamente no estrategista general de brigada Luis Alves de Lima e Silva, o "herói" da Balaiada, o Duque de Caxias, o Pacificador, o Patrono do Exército que emprestou a data de seu nascimento ao dia do soldado, onde se visualiza seu busto moldado em argila, ao lado de peças de artilharia pesada no centro da praça pública, erguida no cume do Morro do Alecrim, batizada de Praça Duque de Caxias. Ao lado direito da praça um magnífico prédio denominado Memorial da Balaiada, inaugurado em 16 de dezembro 2004 pelo Governador José Reinaldo Carneiro Tavares, guarda relíquias e documentos da época.
Apesar de o memorial apresentar justas homenagens ao Duque, e demonstrar o cotidiano das oligarquias da época, não espelha a realidade dos insurgentes abolicionistas e libertários. Por conseguinte, mesmo com esse tom aristocrático, o memorial deixa emergir a luta subversiva, a atuação e resistência de uma imensa parcela de oprimidos, representados por seus líderes, principalmente Dom Cosme, considerado o mártir da Balaiada.
O povo precisa de heróis e mártires. Sempre foi assim desde os primórdios. Eles comumente são eleitos a essa condição ou criados em figuras de ficção. É um instrumento de alento a autoestima e dá razão a sobrevivência da raça humana. Os heróis e os mártires são referências de esperança contida no traço genético de nossa espécie. Essas personalidades, reais ou imaginárias, nos ensina que nenhuma transformação social, moderada ou radical, ortodoxa ou heterodoxa, pacífica ou violenta, prescinde liderança.
NOTAS
FATOS HISTÓRICOS RELEVANTES
Descoberta da costa maranhense – 26 de janeiro de 1500 - Espanhol Vicente Yáñez Pinzón.
Descobrimento do litoral baiano – 22 de abril de 1500 – Português Pedro Álvares Cabral.
Criação das capitanias hereditárias – 1534 – Rei de Portugal Dom João III.
Ocupação da Capitania do Maranhão - 11 de março de 1535 – Donatário Fernando Álvares de Carvalho.
Abolição dos escravos no Reino da Corte portuguesa, exceto nas colônias – 12 de fevereiro de 1761 – Sebastião de Carvalho e Melo, o Marques do Pombal.
Fundação da Vila de Caxias das Aldeias Altas – 24 de janeiro de 1812 - Maranhão.
Extinção formal das capitanias hereditárias - 28 de fevereiro de 1821.
Criação do Vice Reino do Grão Pará e Maranhão - 29 de setembro de 1821 – Governador Bernardo da Silveira Pinto da Fonseca.
Proclamação da independência do Brasil – 7 de setembro 1822 – Dom Pedro I – São Paulo.
Batalha do Jenipapo - 13 de março de 1823 – vitória do Major português João José da Cunha Fidié - Piauí.
Prisão de Fidié – 1º de agosto de 1823 – Caxias.
Nascimento do poeta Antônio Gonçalves Dias - 10 de agosto de 1823 – Caxias.
Abdicação de Dom Pedro I – 7 de abril de 1831 – Rio de Janeiro.
Período Regencial – 17 de julho de 1831 a 18 de julho de 1841 – Rio de Janeiro e Petrópolis.
Criação da Guarda Nacional – 18 de agosto de 1831 – Regência Trina Permanente – Ministro da Justiça Padre Diego Antônio Feijó.
Emancipação da cidade de Caxias - 5 de julho de 1836 – Regente Padre Diogo Antônio Feijó.
Início da Balaiada – no decorrer de 1838 – Partido dos Ben-ti-vis.
Tomada da cidade de Caxias – 1º de julho de 1839 - Balaios.
Coroação de Dom Pedro II – 23 de julho de 1840 – Rio de Janeiro.
Fim da Balaiada – 15 de janeiro de 1841 – General Francisco Sérgio de Oliveira.
Titulo de nobiliatico de Duque de Caxias – 18 de julho de 1941 – Dom Pedro II.
Enforcamento de Dom Cosme – 20 de setembro de 1842 – Itapecuru Mirim
Morte do poeta Antonio Gonçalves Dias na costa do Maranhão, náufrago do navio Ville de Boulogne – 3 de novembro de 1864 – São Luis.
BIBLIOGRAFIA
Albuquerque, Manoel Maurício de. Pequena História da formação social brasileira. Rio de janeiro, Graal, 1981.
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